terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Janice conhece Saulo




Era um final de tarde chuvoso e Janice voltava do trabalho pra casa. No ponto de ônibus, segurando o seu guarda chuva, Janice olhava as horas enquanto se protegia dos pingos. Era uma terça feira e já passava das seis e só Janice estava no ponto de ônibus. Janice era moça loira de seus vinte e cinco anos, magra e calada. Nesse dia, Saulo, um rapaz alto e forte, bonito e simpático, de cabelos lisos e macios passou pelo ponto de ônibus com seu carro bonito e pediu uma informação à Janice. Ela respondeu prontamente. Ele agradeceu oferecendo-a uma carona. Ela disse que não, mas ele insistiu e disse que seria uma desfeita. Janice titubeou, olhou para os dois lados da rua, suspirou sem fazer barulho e, antes de entrar no carro ainda pensou em desistir novamente, mas desistiu de desistir, pois aceitar uma carona de um estranho pudera ser a maior aventura dela até este momento. Os dois saíram então rumo ao sul da cidade. No carro ainda se ouvia a canção que Saulo ouvia: “She”, música de Charles Aznavour, cantada por Elvis Costello. Típico. O carro foi se distanciando até sumir no horizonte debaixo da chuva que já caía devagar. No dia seguinte Janice não apareceu pra trabalhar.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011





¿Quem pensam que são os escritores? Por que acham que seus textos – ou textículos – serão lidos? Acham que são deuses? Que necessidade sentem em expor suas idéias, criar personagens, criticar os semelhantes, ou simplesmente expressar o belo por meio de palavras? Ora, fiquem quietos! Por que acham que os leremos? Temos mais o que fazer. Temos festas para ir. Vem chegando o carnaval. Por que será que os escritores acham que seus escritos são relevantes? Por que se consideram acima dos demais? Quem lhes disse que poderiam publicar livros ou infestar a internet com seus textos mais ou menos? Caro leitor, você não acha que é de uma pernosticidade um cara que você nem conhece, escrever um texto e tentar dialogar com você como se fosse seu amigo de infância? Ou arriscar em te dar um conselho sobre fazer ou não uma coisa, sem ao menos te conhecer? E, como se não fosse pouco, os escritores usam os recursos da língua e assassinam a gramática se defendendo com o que chamam de licença poética. E ainda usam um tal de neologismo para criar novas palavras que só existem em sua mente debiloidizada e subinteligentemente afetada. É o fim da picada. E as rimas pobres da poesia? Quem diria? A forma mais rápida de sintetizar uma idéia em forma de mera baixaria. Seria como uma espécie de metapsicologia enfeitada com pétalas cintilantes e o lirismo clown de Shakespeare. Ufa! Os escritores estão no topo da cadeia alimentar do pseudointelectualismo comedido e surgem como duplas sertanejas em Goiânia. E ainda lançam questionamentos instigantes ao leitor como se o coitado já não tivesse problemas demais, o escritor tira da manga uma questão filosófica cultural transcendental, além de, às vezes, usar palavras que ninguém, além de meu antigo professor de latim, usaria. Sinceramente eu não sei onde eles pretendem chegar estuprando nossas idéias com seus textos bem dotados. Se alguém souber me avise. Ou será que eu não estaria exagerando?

domingo, 25 de dezembro de 2011

Hoje é dia de natal, e eu não deveria revelar, mas revelar-vos-ei. Dentre os meus outros mil quatrocentos e noventa e sete defeitos, (um é usar a mesóclise) eu tenho inveja. Mas não inveja de ter o corpo sarado como os bombados da academia, (se bem que um pouco menos de barriga cairia bem) tenho inveja de saber escrever tão bem como meu amigo Ricardo Lemos. Era só isso que eu queria dizer nessa manhã de natal. Acho impressionante a maneira dele falar lindamente sobre as coisas sérias. E eu não entendo nada de mar mesmo. Deixa pra lá. Sou só um metido a poeta que escreve rápido por preguiça e porque tenho dores na coluna quando fico muito tempo sentado no computador. Queria escrever como Ricardo Lemos, lindo e profundo. Mas chega de rasgação de seda. Nesta manhã cintilante de natal só gostaria de compartilhar minha inveja branca. Espero curar minhas dores e estou tentando aprender um pouco mais a cada dia. E não levem a inveja ao pé da letra. É só uma admiração ressentida. E afinal, é natal, os sinos dobram. E eu vou tomar minha primeira cerveja do dia.

terça-feira, 20 de dezembro de 2011



Eu queria mesmo era ser modelo
Mas Deus não me fez bonito
Eu queria era desfilar e ganhar dinheiro... viajando
Mas não, fui ser esse poeta feio, sem recheio
Meio atordoado e sequelado por inteiro

Se eu fosse modelo
Nem entrevistas eu daria
Eu seria um lindo chato rico
Exibindo minha face, meu corpo
Minha sensualidade em capas de revista

Eu ficaria admirando a minha beleza
E depois choraria de tristeza
Por não ter tido um verdadeiro amor
Mas, pra quê amor?
Eu seria um só sem medo

Se eu fosse modelo
Cheiraria muita cocaína
Sei lá, acho que combina
Viveria em esquinas
E em festinhas cheias de meninas

Eu acordaria cedo
Tiraria fotos, beberia água com gás
Leria Paulo Coelho
E viveria me olhando no espelho
Ah, eu queria mesmo era ser modelo

ateando



Ando sem acreditar em nada. Nada me encanta quanto antes. Em política nunca acreditei, mas hoje em dia, menos ainda. Tenho a sensação ínfima de que não vai dar certo. Não acredito mais em bruxas, em fantasmas, em serelepices. Não que eu não goste de nada. Ou que eu tenha a cara fechada. Só não acredito mais em nada, nem em amor e nem em natal, nem em contos de fadas, nem que eu seja um bom escritor, ou apenas um grande cara de pau que faz rimas pobres sem muito rigor e sem se importar com o visual. E, não, Vanguart de Hélio Flanders, eu não acredito no semáforo, nem no avião, nem no relógio. Não acredito, por exemplo, que a usina de Fukushima ou a de Belo Monte tenham culpa no cartório. Não acredito que o homem tenha pisado descalço na lua. Não acredito em mentiras, nem em verdades sem considerações. Não acredito em arrependimentos, não acredito em casamentos, não acredito em flores de dezembro. Puxa, estou sinceramente ateando. Se é que vocês me entendem. Eu não acredito nem que possa conseguir, não acredito em eternidades terrenas, nem em dietas de faquir. Não acredito na rima besta ou que o Zé Ramalho saiba o que signifique “grão-vizir”. Não acredito em sacanagens póstumas que nos possa divertir. Tenho a sensação de que além de não acreditar mais em nada, eu não saiba mais sentir.

sábado, 10 de dezembro de 2011

"ISTO"


Lembro que há algum tempo atrás, me perguntaram se havia algum texto que eu gostaria de ter escrito. Não me lembro o que eu respondi na época. Se me perguntassem hoje, eu responderia "ISTO":

Dizem que finjo ou minto
Tudo que escrevo. Não.
Eu simplesmente sinto
Com a imaginação.
Não uso o coração
Tudo o que sonho ou passo,
O que falha ou finda,
É como que um terraço
Sobre outra coisa ainda.
Essa coisa que é linda.
Por isso escrevo em meio
Do que não está ao pé,
Livre do meu enleio,
Sério de que não é.
Sentir? Sinta quem lê!

(f.p.)

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

"Circensis"


Esse circo aí não é dos piores. O pão eu vou ficar devendo...

"Panis et Circensis"



Julio Cezar, na Roma Antiga, um dia disse: Ad populum Panis et circencis. Para o povo, pão e circo. Ora, parece que essa doutrina é seguida à risca aqui no Brasil. Tenho a impressão de que nossos governantes querem mesmo apenas nos alimentar e nos proporcionar diversão para que não nos rebelemos. Para que nos esqueçamos das angústias e pobrezas, e misérias, e corrupções e injustiças, e da farra feita com o dinheiro público, e mais um monte de pilantragens e injustiças que acontecem por aí. Mas não nos revoltemos... Temos o nosso Panis et circensis: Bolsa Família e a Copa do Mundo que vem chegando por aí. E acho que às vezes confundo quem são os palhaços desse circo. Ora, alegremo-nos!